Chesterton (1874-1936) compreendeu sua época como poucos, e não foi uma época qualquer. No alvorecer do modernismo e da secularização do Ocidente, sua filosofia estava fundamentada na importância do dogma. Numa época de "racionalismo" extremo, em que muitos davam a religião, em especial a cristã, como morta, ele defendia uma estreita ligação entre razão e religião.
Hereges expõe o pensamento e a filosofia do autor, identificando, de forma brilhante e sutil, as incongruências do mundo moderno através da filosofia de seus contemporâneos. Para ele, o ceticismo do seu tempo, ao invés de eliminar as crenças vigentes, estava criando outras, como a crença no progresso e no próprio homem.
Não é uma leitura fácil, mas não porque tenha uma redação complexa ou uma linguagem erudita, mas porque suas ideias podem soar paradoxais para uma mente desatenta. Fica claro, à medida que você se aprofunda na leitura, que ele quer atrair a inteligência de quem busca por algo, para encontrar pessoas que poderiam, no início, não suspeitar ou não estarem dispostas a admitir que o que buscam de fato é a verdade universal que está contida na religião. E isso tudo tem relação com seu próprio processo de conversão e com a época em que vivia - ele escreveu o livro anos antes de se converter ao catolicismo.
Ao final, de forma premonitória, ele faz uma previsão sombria para o futuro da humanidade a partir das mudanças que já se desenhavam no seu tempo:
A grande marcha da destruição mental continuará. Tudo será negado. Tudo se tornará um credo. É razoável negar a existência das pedras da rua; será um dogma religioso declará-lo. É uma tese racional dizer que vivemos num sonho; será sanidade mística dizer que estamos acordados. Velas serão acesas para atestar que dois mais dois são quatro. Espadas serão empunhadas para provar que as folhas são verdes no verão. Ficaremos a defender não somente as virtudes e sanidades inacreditáveis da vida humana, mas algo mais inacreditável ainda: este imenso universo impossível que salta aos olhos. Seremos aqueles que olharão a grama e os céus impossíveis com estranha coragem. Seremos aqueles que viram e creram.
A ortodoxia cristã que Chesterton abraçou acabou se tornando a heresia do mundo moderno.
Editora Ecclesiae; 1ª edição (2011). Clique aqui para comprar o livro na Amazon. Disponível também no Kindle Unlimited.
Notas sobre o autor: Gilbert Keith Chesterton foi um grande escritor inglês do final do século XIX e início do século XX. Tornou-se ainda vivo um popular ensaísta, frasista, romancista, contista, dramaturgo, jornalista, palestrante, biógrafo e crítico. Convertido do anglicanismo ao catolicismo, é também considerado filósofo e teólogo pela profundidade de suas reflexões sobre a fé e o mundo moderno. Escreveu nos mais variados estilos de texto, indo da fantasia e dos contos que inspiraram a criação do famoso Sherlock Holmes à tratados de filosofia e teologia. Criou uma teoria econômica não socialista e não capitalista, chamada distributismo (ou distributivismo). E existe até oração que pede por sua canonização. Seu trabalho alcançou todo o mundo e rendeu-lhe elogios de intelectuais das mais distintas filiações políticas, desde socialistas à apologistas católicos. A quantidade de escritos que deixou é espantosa, considerando sua idade.
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