Um ensaio sobre liberdade
Presente na vida de todos nós, o Estado é universalmente considerado a instituição do serviço social. Venerado por alguns, afável para outros e considerado necessário pela maioria, essa entidade, na verdade, é bem menos benevolente do que aparenta ou querem nos fazer pensar.
Neste pequeno livro, o economista Murray N. Rothbard, um ardoroso defensor da liberdade e autor de centenas de artigos acadêmicos e de mais de 20 livros, nos descreve, de maneira direta e sem rodeios, emoções ou fantasias, o que o Estado realmente é, e o que ele não é.
A despeito do que você acredita, não há como negar que existe uma camuflagem ideológica, incutida na mente de todos nós, que distorce nossa visão do que realmente a vida política se trata.
Segundo Rothbard, o caminho social determinado pelas necessidades naturais do homem é o caminho do direito de propriedade e do livre mercado de se doar ou trocar tais direitos. O Estado, por sua vez, é o canal legal e sistemático para a predação da propriedade privada e para apropriação do que é produzido. Como a produção deve ser sempre anterior à produção, o livre mercado é anterior ao Estado. Podemos concluir, dessa forma, de que o Estado nunca foi criado por um "contrato social"; ele sempre nasceu da conquista e da exploração.
Mas como conseguir a aceitação, muitas vezes resignada, da maioria das pessoas para esse controle do Estado? Para o autor, é somente por meio da ideologia que esse domínio passa a ser considerado bom (ou ao menos inevitável) e melhor do que as alternativas. Desta forma, o papel dos intelectuais, os formadores de opinião, se torna crucial para afirmar e reafirmar este pensamento. E é através da aliança destes com o Estado que esse papel se torna mais claro.
A utilização cada vez maior do jargão científico permite aos intelectuais fazerem uma apologia obscurantista ao Estado, tornando o parasitismo predatório aparentemente moral e esteticamente sublime em comparação ao trabalho produtivo e pacífico. Sendo assim, a maior ameaça ao Estado passa a ser a crítica intelectual independente, dado que o homem mais perigoso para qualquer governo é o homem capaz de pensar por si mesmo, aquele que possui coragem de questionar o pensamento vigente sem se apegar a dogmas ou superstições. Entretanto, alerta Rothbard, o Estado sempre tentará podar a opinião quando ela é ainda incipiente, ridicularizando qualquer ideia que desafie a opinião das massas (ou do que ele se apropria como opinião).
Quanto à legitimidade, o Judiciário exerce um papel importante ao transformar as ações do governo em Escritura Sagrada para a maioria das pessoas. Apesar da sua aparente independência, o Judiciário também é parte da máquina governamental, sendo nomeado, nas suas instâncias superiores, pelos poderes Executivo e Legislativo. Seria como se o Estado advogasse em causa própria, violando o princípio jurídico básico de se buscar decisões justas. Um bom exemplo disso é a interpretação da Constituição. Uma interpretação estrita ou mais ampla dependeria dos grupos que controlam o Estado, resultando na subversão da própria Constituição.
Assim, o Estado demonstra uma incrível aptidão para a ampliação de seus poderes além dos limites impostos pela Lei. Como ele vive necessariamente do confisco compulsório do capital privado, e como sua expansão necessariamente envolve violações cada vez piores ao indivíduo e à iniciativa privada, é possível dizer que o Estado é profunda e inerentemente anticapitalista. Ao contrário do dito marxista segundo o qual o Estado é o "comitê executivo" da classe dominante atual, supostamente capitalista, o Estado, na verdade, constitui e é a fonte da "classe dominante", e está permanentemente em oposição ao capital realmente privado.
Ao final, Rothbard conclui que a história da humanidade, sobretudo sua história econômica, pode ser vista como uma disputa entre os princípios da cooperação pacífica e exploração coercitiva, ou seja, entre produção e predação. O poder social é o poder do homem sobre a natureza, a transformação cooperativa dos recursos naturais e a descoberta das leis da natureza em benefício de todos os indivíduos. O poder estatal, por sua vez, é a tomada parasitária e coerciva da produção - a usurpação dos frutos da sociedade em benefícios de governantes não produtivos. Enquanto o poder social é poder sobre a natureza, o poder estatal é o poder sobre o homem.
Este não é um livro para se fazer proselitismo ideológico, mas para refletirmos até que ponto somos influenciados pelo jargão de que "ruim com ele pior sem ele" quando nos referimos ao controle e influência estatal em nossas vidas. Isso é realmente válido para nos deixar consolados e conformados com nossa limitada liberdade? Até que ponto é possível acreditar no famoso "Sistema de Freios e Contrapesos" de Montesquieu para conter os abusos de poder? Eu diria que somente um pensamento crítico independente nos liberta das amarras impostas pela ideologia que sustenta e retroalimenta esse e qualquer outro sistema de controle social. Há alternativas? Se nunca nos questionarmos, nunca haverá de fato. Mas independente de as encontrarmos, ou não, o simples exercício crítico já é um sopro de frescor libertário em nossas mentes e atitudes. Uma esperança de que a humanidade sempre resistirá, de uma forma ou outra, à tirania e ao obscurantismo do pensamento único.
Lançado originalmente em inglês, no ano de 1974, este livro é um dos mais populares escritos do economista e filósofo americano Murray N. Rothbard, um dos principais discípulos do economista austríaco Ludwig von Mises. Dando início ao projeto de lançar em português das obras completas do autor, a LVM Editora optou por uma tradução em português, elaborada por Paulo Polzonoff, a partir da edição norte-americana publicada em 2009 pelo Ludwig von Mises Institute. Nesta nova versão, foi acrescentado um prefácio exclusivo do professor Adriano de C. Paranaíba.
Notas sobre o autor:
Murray N. Rothbard (1926-1995) foi foi um economista, historiador e filósofo político norte-americano. Firme defensor do revisionismo histórico e uma figura central no movimento libertário americano do século XX, ele escreveu mais de vinte livros sobre teoria política, história, economia e outros assuntos. Ao longo de sua vida, esforçou-se para criar uma abordagem sistemática da liberdade, cobrindo todas as disciplinas das ciências humanas. Muitos jovens escritores e ativistas libertários das décadas de 1960 e 1970 o consideram uma influência fundamental, tanto intelectual quanto pessoalmente. Rothbard não foi um intelectual de "torre de marfim", do tipo que se trancava em seu mundo e se interessava apenas por controvérsias acadêmicas. Muito pelo contrário, ele combinou elementos de economia da Escola Austríaca com uma fervorosa defesa da liberdade individual. O resultado foi uma nova filosofia política; e Rothbard dedicou sua notável energia intelectual, durante um período de quarenta e cinco anos, para desenvolver e promover seu estilo de libertarianismo. Ao fazer isso, ele se tornou um gigante do intelectualismo americano.
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