Ácido na medida certa
Candidato ao Oscar desse ano, Ficção Americana vem dividindo opiniões de forma bem acentuada. Polêmicas à parte, e não são poucas, o filme é realmente bom. Ao lidar de forma satírica, e por vezes ácida, sobre um tema caro e sensível para o povo americano, ele não escolhe lados, mas consegue provocar o espectador a refletir sobre seus próprios vieses de julgamento.
Monk, interpretado pelo ator Jeffrey Wright, é um escritor de ficção e professor universitário de literatura. Talentoso, ele se ressente de que suas obras sejam vistas como literatura "afro-americana" e não como livros de ficção como qualquer outro. Cansado dos estereótipos criados por uma cultura que se alimenta deles para justificar seus discursos vazios sobre diversidade e representatividade, Monk é um negro que não quer se vitimizar pela cor de sua pele.
Numa crise criativa e sem publicar nenhum livro há anos, ele se vê numa encruzilhada: ou atende um mercado ávido por livros sobre "histórias negras" de sofrimento e vitimização ou continuará sem conseguir emplacar nenhum novo romance. Ao escrever, de forma irônica, uma obra que vai de encontro aos estereótipos que ele tanto abomina, ele se surpreende com o seu sucesso.
O filme ainda conta com um drama familiar que nos ajuda a compreender mais de sua personalidade e da sua forma de ver o mundo. E isso acaba se tornando importante para entendermos o dilema que ele enfrenta ao encarar sua própria realidade.
Ficção Americana acaba por revelar as idiossincrasias de um povo que, ao tentar apaziguar uma questão que marcou sua história, parece que exagerou na dose e se perdeu na solução. Um sistema que se alimenta de estereótipos para sustentar e beneficiar aqueles que se aproveitam da divisão e do ressentimento para atender seus próprios interesses.
Um grande filme. Vale a pena assistir, mas de mente aberta e atenta. Não caia na própria armadilha que ele nos revela.
Assista ao trailer oficial:
